Acorde já: entenda o movimento que combate o vício nas redes sociais
Página viral funciona como “alerta” para pessoas que estão “presas” em postagens nas redes sociais; especialistas explicam fenômeno
atualizado
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Os usuários mais assíduos das redes sociais provavelmente já aram por aquele momento de quase “hipnose”: rolar a tela sem parar, assistindo a uma sequência infinita de vídeos, até perceber que horas se aram – e que pouca coisa ficou na memória ou fez diferença de verdade.
Esse fenômeno é um dos mais comuns na vida digital e representa um grande desafio para quem tenta escapar desse ciclo. A página Acorde Já viralizou no Instagram propondo exatamente isso: funcionar como um “alerta” – ou, para alguns internautas, uma verdadeira “blitz” – para interromper essa “hipnose” com vídeos curtos e provocativos.
O que é essa hipnose?
- Ficar “hipnotizado” por vídeos nas redes sociais é, na verdade, um estado de intensa captura de atenção, impulsionado por mecanismos de dopamina – neurotransmissor ligado à motivação, ao estímulo e à sensação de recompensa.
- Segundo o psicólogo Matheus Karounis, esse fenômeno é chamado de “fluxo dopaminérgico contínuo”, no qual o sistema de recompensa do cérebro é estimulado sem pausas por uma sequência ininterrupta de novos estímulos, gerando um ciclo de gratificação instantânea.
- Já o psicanalista Artur Costa explica que as plataformas digitais são projetadas justamente para prender a atenção do usuário com estímulos rápidos, recompensas imediatas e um fluxo incessante de conteúdo.
- Esse mecanismo ativa os circuitos de dopamina no cérebro, reforçando a sensação de prazer e tornando a rolagem infinita ainda mais viciante.
A página Acorde Já utiliza uma estratégia curiosa para despertar os usuários desse ciclo: seus vídeos sempre começam com um viral das redes, mas terminam com um alerta direto sobre a “prisão” do consumo automático de conteúdo. Na biografia, a proposta fica ainda mais clara: “seu lembrete diário para sair da hipnose”.
Em entrevista ao Metrópoles, Alan Alves, criador da Acorde Já, contou que a ideia surgiu após perceber que ele próprio estava perdendo muito tempo assistindo a vídeos curtos nas redes sociais. “Assim como muita gente, eu ava horas e horas no celular e, no fim, não aproveitava o meu dia”, lembra.
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Ele se deu conta de que, em raros momentos, “acordava” e se dava conta de que havia ficado em um “transe”. Foi então que pensou na necessidade de um lembrete para ajudar outras pessoas a saírem desse estado e decidiu criar a página, que hoje acumula mais de 700 mil seguidores. Alguns de seus vídeos mais virais ultraam 3 milhões de visualizações.
“Muitas pessoas me dizem que conseguiram mudar suas rotinas graças aos lembretes diários e que agora gastam menos tempo nas telas e mais tempo se dedicando a si mesmas. Só por esse , já sinto que ter criado a página valeu muito a pena”, afirma Alan.
Por que sentimos que precisamos “acordar”?
Para o psicanalista Artur Costa, o aumento da autoconsciência sobre o tempo gasto nas redes sociais está diretamente ligado à percepção de perda de tempo e à frustração com a baixa produtividade.
“Esse ‘despertar’ surge da necessidade de retomar o controle sobre o próprio tempo e buscar atividades que proporcionem um sentido maior, seja no trabalho, nos relacionamentos ou no desenvolvimento pessoal”, explica.
O especialista detalha ainda que existe um fascínio do público pelo inesperado e pelo bizarro, que já é explicado pela psicologia do entretenimento, o que facilita o consumo excessivo de conteúdos considerados “inúteis”.
“O cérebro humano busca constantemente novidades e recompensas fáceis, e conteúdos considerados “inúteis” geralmente entregam isso de forma rápida e envolvente. Esses vídeos oferecem um alívio momentâneo do estresse e das pressões do cotidiano, permitindo que as pessoas se distraiam sem precisar de esforço cognitivo significativo”, pontua.
Como se desvencilhar?
Para além de páginas com avisos e alertas para “acordar”, existem ferramentas e atitudes que internautas podem tomar para se desvencilhar da “hipnose”. No Tiktok, por exemplo, a própria plataforma conta com uma ferramenta de determinar por quanto tempo o usuário quer ficar dentro do aplicativo.
Apesar de ser uma solução, Artur Costa avalia que a eficácia depende da disciplina do usuário. “Para que funcionem, é necessário que o usuário tenha uma intenção clara de reduzir o tempo de uso e esteja disposto a respeitar esses limites”, explica.
Ele sugere também estratégias como configurar timers no próprio celular, deixar o telefone longe em momentos críticos e criar hábitos alternativos como ler ou praticar exercícios, como novas soluções.
Matheus Karounis concorda salientando que essas ferramentas de controle de tempo são úteis como e externo, mas precisam ser integradas a uma estratégia mais ampla de autorregulação. “O verdadeiro “quebrar da hipnose” ocorre quando desenvolvemos maior consciência sobre nossos padrões de uso e estabelecemos limites internos mais robustos”, frisa.