Busca por hotéis fazenda aumenta no DF. O que avaliar ao se hospedar?
Hotéis fazenda e casas de campo estão abertos e com lista de espera. Contudo, é preciso avaliar protocolos, ainda pouco definidos
atualizado
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Já se aram mais de 140 dias desde que a Organização Mundial da Saúde (OMS) caracterizou a Covid-19 como uma pandemia. Desde então, pessoas no mundo todo têm convivido com rotinas desgastantes e poucas opções de escape. Com isso, isolamentos voluntários, antes seguidos à risca, acabaram, aos poucos, cedendo a corridas ao ar livre de máscara, piqueniques no parque e, mais recentemente, viagens para locais isolados com a família.
Dados do Google indicam que as buscas pelo termo “hotel fazenda em Brasília” registraram aumento de 70% nos últimos 30 dias. O movimento foi percebido pelo setor, que se desdobra para atender a demanda por hospedagem e adotar novas medidas de segurança.
“Pirenópolis e Chapada dos Veadeiros ainda estão fechados para o turismo. São lugares que os brasilienses gostam de ir. Isso influencia”, afirma Ronaldo Triacca, um dos proprietários da Villa Triacca Eco Pousada e Vinho, localizada a 62 quilômetros do centro de Brasília.
Ao contrário do que muitos imaginavam, esses estabelecimentos não foram obrigados a fechar as portas em Brasília. Alguns empresários optaram por fazê-lo para avaliar o cenário e adotar os cuidados que julgassem pertinentes para o momento. Isso porque, de acordo com eles, não há, em âmbito governamental, nenhum protocolo que considere ou mencione as especificidades do turismo rural.
A Vigilância Sanitária editou uma nota técnica, com orientações para a rede hoteleira no geral, incluindo motéis. A maioria dos donos de hotéis fazenda e casas de campo, no entanto, não está ciente do documento, que estabelece uma série de obrigações e proíbe, entre outros, o uso de piscinas, saunas e alimentação em esquema de self-service.
O Metrópoles consultou a Secretaria de Saúde, pasta a qual a Vigilância Sanitária é vinculada, pedindo mais esclarecimentos sobre as normas para esses locais. Em resposta, a pasta limitou-se a dizer que “a Nota Técnica 39 da Vigilância Sanitária deve ser observada por qualquer tipo de hotel e motel”.
Crescimento de demanda x Novos protocolos
Por enquanto, cada empresário está se virando como acha viável. Cabe aos próprios clientes avaliar se as mudanças são suficientes para garantir a segurança da família.
“Reduzimos o número de leitos e a quantidade de mesas e aumentamos a distância entre elas. O bufê é servido apenas por funcionários, estamos aferindo a temperatura de colaboradores e hóspedes diariamente. A máscara é de uso obrigatório em todos os ambientes de circulação livre. Como o espaço é bem amplo, não há contato entre os hóspedes. Tem dado certo”, relata Triacca.
Apesar das incertezas em relação a riscos e protocolos, a procura por pacotes de fim de semana em todos os hotéis fazenda ouvidos pelo portal aumentou consideravelmente nos últimos dias. “Recebemos uma média de 150 e-mails por dia de pessoas buscando informações sobre reservas. Para atender, estamos tendo que contratar outras duas pessoas”, ressalta o dono da Villa Triacca.
O Rancho dos Canários, localizado a 100 quilômetros de Brasília, foi reaberto há menos de uma semana e também está sem quartos vagos para os próximos dias. “Ficamos 120 dias fechados e abrimos segunda-feira (27/7), com 50% da capacidade do hotel. Adotamos alguns protocolos, como uso de máscara e luvas pelos funcionários, distanciamento de mesas e fechamento da sauna. Temos recebido muitos pedidos de reserva. As pessoas estão esse tempo todo sem sair de casa”, justifica a proprietária do espaço, Sirlei Abreu.
Casa de campo
Localizado entre Ceilândia e Samambaia, o Rancho do Moreira funcionava como pesque-pague até o início deste ano. Em fevereiro, o dono, Ronan Moreira, inaugurou seis quartos para dar início a uma pequena pousada. A empreitada deu certo por um mês e, logo em seguida, a pandemia do novo coronavírus começou.
Após dias pensando em como salvar o negócio, Renan resolveu colocar a propriedade para alugar nos finais de semana. O local recebe um grupo exclusivo, de até 14 pessoas, por vez. “Assim, resolvemos a questão do restaurante, que não pode abrir. Cada família traz seus mantimentos, utiliza a estrutura e ela é higienizada rigorosamente após a saída das pessoas”.
O formato deu tão certo que o empresário não pretende reabrir a pousada. “Estamos com os fins de semana fechados até outubro”, conclui.
O que pensam especialistas
O professor Luiz Trigo, do curso de Lazer e Turismo da Escola de Artes, Ciências e Humanidades da Universidade de São Paulo (USP) acredita que esse tipo de turismo, que pode ser caracterizado como o “novo turismo de isolamento”, deve ganhar força nos próximos meses.
Ele também defende não ser viável paralisar todas as atividades turísticas por mais tempo.
“Os turistas terão de procurar locais que realmente tenham condições de diminuir o número de leitos e adotar todas as medidas necessárias. É claro que isso também vai depender do turista, que é co-responsável, não de viajar com sintomas de gripe. Tem continuar seguindo recomendações de higiene e evitar aglomerações”, destaca Luiz.

Na opinião da infectologista Ana Helena Germoglio, para viajar com segurança e consciência tranquila nos próximos meses será preciso observar alguns critérios, como escolher estabelecimentos com condições de oferecer protocolos de biossegurança adequados, tanto para hóspedes quanto para funcionários.
“No momento, todo mundo pode ser um potencial portador e transmissor do vírus. Ao estar em um local onde circulam outras pessoas, é fundamental refletir: ‘esse lugar tem mesmo condições de me proteger, se houver um hóspede com Covid-19?”, explica a médica.
Ela aconselha as pessoas a evitarem eios e atividades em ambientes coletivos, mesmo que eles estejam liberados pelo estabelecimento. Piscinas de uso comum, por exemplo, nem pensar. “A água não é o meio ideal para o coronavírus, mas as aglomerações dentro dela o são”, afirma.
A médica Ana Escobar chama atenção para outro aspecto: o moral. “A orientação é para que todos fiquem em casa. Para que menos pessoas adoeçam e, assim, os profissionais de saúde tenham condições de dar atendimento digno a todos os que necessitam. Já pensou que os hospitais estão lotados e que viajar pode aumentar a chance de acidentes graves? Para onde irão estas pessoas?”, questiona.
“Vale a reflexão: a liberdade de decisão de cada um, desde que dentro da lei, é inquestionável. Mas pode, sim, ser questionável sob o aspecto do exemplo de respeito humano que deixamos claro com as atitudes que tomamos, principalmente nos momentos mais difíceis e restritivos da vida”, opina Ana.