Presídio de SP abriga matadores e traficantes da máfia chinesa
Destinada a criminosos estrangeiros, penitenciária em Itaí, no interior de SP, tem 27 chineses. Maioria está detida por tráfico de drogas
atualizado
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São Paulo — A Penitenciária Cabo PM Marcelo Pires da Silva, em Itaí, cidade do interior paulista que fica a quatro horas da capital, é a única do Brasil voltada apenas a estrangeiros. A unidade é considerada modelo, sem a tensão no ar que reina nos presídios dominados pelo Primeiro Comando da Capital (PCC). É ali que está um discreto, mas perigoso grupo de detentos ligados a quadrilhas chinesas formadas por matadores, sequestradores e traficantes.
O Metrópoles analisou a ficha da maioria dos 27 presos chineses que vivem no local. Os traficantes são a maior parcela, um total de 11. Mas os perfis variam desde pessoas presas pelo tráfico de metanfetamina até aqueles presos após serem flagrados tentando levar drogas para a Europa. Esses últimos, conhecidos como mulas, muitas vezes são forçados por mafiosos a praticar esse tipo de crime para pagar dívidas, segundo a reportagem apurou.
Nesta semana, o Metrópoles publica uma série especial sobre a atuação da máfia chinesa em São Paulo. Leia nos links abaixo os dois primeiros capítulos:
Máfia chinesa expande atuação em SP, com extorsões, tráfico e arsenal
Máfia chinesa se alia ao PCC na droga do sexo e usa hotéis e fintechs
Um dos traficantes presos no local é Pikang Dong, 69 anos, preso no ano ado sob suspeita de ser um dos chefões de uma quadrilha de chineses, mexicanos e nigerianos que domina a venda de metanfetamina no centro de São Paulo. Foi a partir do celular do traficante que investigadores encontraram um manancial de mensagens sobre a rede de entregas da droga nas ruas, em hotéis, motéis e até em uma mansão nos Jardins, bairro nobre paulistano.
Ao mesmo tempo, também é possível encontrar dois detentos presos no aeroporto de Guarulhos. Um deles, por exemplo, tentou embarcar para Paris com cinco quilos de cocaína.
Os detentos chineses costumam manter-se discretos. Muitos não recebem visitas, mandam cartas e limitam-se a receber advogados. A ideia é fazer de tudo para reduzir a pena e sair dali o mais rápido possível. Para ar o tempo, jogam entre si, fumam um cigarro atrás do outro e assistem novelas, um bom jeito de aprender português. O aprendizado da língua ainda é ajudado pela grande quantidade de dicionários enviados pelo Consulado da China – órgão que faz da ala chinesa da biblioteca de Itaí uma das maiores, devido ao grande volume de livros mandados para a prisão.
Mesmo aprendendo rápido o português, só utilizam o idioma quando acham conveniente, e não gostam de se misturar com outras nacionalidades. A conduta é diferente do que acontece com latinos, por exemplo, que preferem se juntar às celas de criminosos que cometeram os mesmos tipos de crimes que eles – por exemplo, os condenados por roubo.
Parte dos detentos orientais é acusada de envolvimento com a chamada máfia chinesa. Os integrantes do grupo mafioso Bitong, por exemplo, acusado de aterrorizar comerciantes do centro de São Paulo com extorsões, sequestros e assassinatos, chegaram a ficar juntos no local. Hoje, o único que do grupo que resta é o homem apontado como o matador número um da máfia, Bo Lin, 38 anos.
Dono de uma extensa ficha policial que inclui acusações por extorsão, sequestro, associação criminosa e dois homicídios, ele já foi condenado a 20 anos de prisão apenas por um dos casos, em que teria cobrado R$ 300 mil dos pais de um jovem chinês para libertá-lo. Por incidir dez vezes no crime de extorsão em um único processo, o criminoso foi condenado a 142 anos de reclusão. Ele se diz inocente das acusações.
Assim como a maior parte dos seus comparsas, o detento é natural de Fujian, província no sudeste da China conhecida por exportar gangters para vários países ao redor do mundo. Bo Lin chegou ao Brasil em 2007 e tinha uma loja no Shopping 25 de Março. Acabou preso em 2017, no Guarujá, para onde fugiu após ser baleado por dois homens.
Na prisão, chegou a cometer uma falta disciplinar grave, que não é detalhada no seu processo de execução penal. No entanto, como outros presos chineses ligados a grupos mafiosos, mantém postura reservada dentro do presídio. Estuda para reduzir a pena e até tirou 123 em português na prova do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), nota considerada acima da média, equivalente a 6.5 no boletim do detento.
Em breve, deve se juntar a ele Lin Xianbin, de 52 anos, outro membro do Grupo Bitong que acabou preso no dia 29 de janeiro quando foi flagrado por câmeras com reconhecimento facial da prefeitura caminhando pela 25 de Março. Ele foi condenado a 18 anos por extorsão mediante sequestro e associação criminosa no mesmo processo em que o comparsa Bo Lin, e estava foragido desde 2023, quando deixou a mesma unidade prisional, em Itaí, para a saída temporária de Natal.