Chefe do PCC foi enforcado por absolver Gritzbach em tribunal do crime
Django e Japa foram mortos após absolverem Gritzbach pela morte de dois membros da facção, segundo relatório da Polícia Federal
atualizado
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São Paulo – A investigação iniciada após o assassinato de Vinícius Gritzbach, aliada à delação premiada feita por ele ao Ministério Público de São Paulo (MPSP), descortinou os bastidores da corrupção propalada por policiais e como, com a anuência deles, o submundo do crime se infiltrou nas estruturas estatais. Investigação da Polícia Federal (PF) revela detalhes sobre episódios cujos envolvidos, até então, eram desconhecidos.
Um deles é sobre a absolvição de Gritzbach, em um “tribunal do crime”, como já revelado pelo Metrópoles. Até o momento, porém, não se sabia quem teria dado o veredito, desresponsabilizando o delator pelos assassinatos, em 26 de dezembro de 2021, de Anselmo Bechelli Santa Fausta, o Cara Preta, e Antônio Corona Neto, o Sem Sangue, ambos do Primeiro Comando da Capital (PCC).
Gritzbach teria desviado dinheiro de Cara Preta e, por isso, encomendado a morte do criminoso – o que ele sempre negou.
Por causa das acusações de seu suposto envolvimento no duplo homicídio, o delator foi sequestrado, em janeiro de 2022. Gritzbach, então, foi levado para um tribunal do crime, no qual foi “absolvido” por Claudio Marcos de Almeida, o Django, e Rafael Maeda, o Japa. Ao garantir a vida de Gritzbach, segundo as investigações da PF, ambos decretaram suas próprias sentenças de morte.
“[Eles] foram mortos em 2023 pelos demais integrantes do PCC, porque ‘absolveram’ Gritzbach da prática do homicídio de Anselmo [Cara Preta] no ‘tribunal do crime'”, diz trecho de relatório obtido pela reportagem.
Absolvição de mortes
Django foi encontrado morto, enforcado sob o viaduto Vila Matilde, na zona leste paulistana, em 23 de janeiro de 2022.
A investigação sobre a morte dele foi arquivada pelo Departamento de Homicídios e de Proteção à Pessoa (DHPP), sob comando do delegado Fábio Baena e do chefe de investigações Eduardo Monteiro.
Cerca de quatro meses depois, Japa foi encontrado morto em um carro estacionado no Tatuapé. Fazia pouco tempo que ele havia prestado depoimento ao DHPP sobre a morte de Cara Preta.
Rival do PCC morto fretou helicóptero para levar R$ 1,5 mi da facção
O caso, primeiramente, foi registrado como suicídio. Depois, peritos constataram que a arma encontrada com Japa, uma pistola 9 milímetros, não havia sido usada, e a história tomou outro rumo.
Outro detalhe que derrubou a tese de suicídio foi o fato de Japa estar com um tiro do lado esquerdo da cabeça e a arma encontrada com seu corpo, sem nenhuma munição deflagrada, estar na mão direita.
Policiais com o PCC
Em fevereiro de 2022, dias após ser absolvido no tribunal do crime, Gritzbach foi preso pelo Departamento de Homicídios e de Proteção à Pessoa (DHPP).
Ele foi conduzido em uma viatura pelo delegado Fábio Baena e pelo investigador-chefe Eduardo Monteiro, que ligaram para o policial civil Marcelo Marques de Souza, o Bombom, com o qual comemoraram a “cana de bilhões“. Os três agentes estão atualmente presos, acusados de envolvimento com o PCC.
Vídeo
Já no DHPP, em uma sala, Eduardo Monteiro telefonou para os “14 do PCC” — uma menção à Sintonia dos 14, composta por membros do PCC responsáveis pela coordenação e pelo cumprimento das regras da facção em 14 regiões específicas da capital, da Grande São Paulo e do interior.
O interlocutor do policial, que seria da cúpula da facção, teria afirmado: “Não façam injustiça com o menino [Gritzbach], o menino não tem nada a ver [com o duplo homicídio]”, reforçando a absolvição dada por membros do crime organizado ao delator.
A decisão, segundo a investigação da PF, gerou um desconforto, supostamente resultando na morte de Django e Maeda – até então, dois importantes membros da facção.
Relações comerciais
Antes das rusgas internas, Gritzbach também mantinha relações comerciais com a maior facção criminosa do país, ajudando-a na lavagem de fortunas, por meio da compra de imóveis de luxo, com valores superfaturados. Um de seus clientes era Claudio Marcos de Almeida, o Django.
Uma denúncia do Grupo de Combate ao Crime Organizado (Gaeco), do MPSP, obtida pela reportagem, explica como Gritzbach ajudou a “clarear” o dinheiro adquirido pelo PCC, obtido com a venda de drogas e armas.
Com base em conversas de WhatsApp, os investigadores conseguiram provar que o empresário, em maio de 2021, chegou a fretar um helicóptero para o transporte de R$ 1,5 milhão, pagos por Django, em dinheiro vivo, como entrada em um imóvel de Bertioga, negociado no papel por R$ 2,5 milhões. O restante do pagamento, como consta em comprovantes de depósitos, foi dividido em 10 parcelas de R$ 100 mil.
O aparente negócio lícito, porém, ocultou o real valor movimentado pelos investigados, que foi de R$ 6 milhões. O documento do MPSP mostra que a casa, situada em uma região badalada do litoral norte paulista, foi colocada à venda por R$ 3 milhões.
Gritzbach foi executado com 10 tiros de fuzil, oito dias após delatar o envolvimento de policiais civis com o PCC. O homicídio, segundo atual fase da investigação, feita pela Polícia Civil de São Paulo, foi executado por policiais militares, a mando do crime organizado.
Já a PF instaurou um inquérito, um dia após o homicídio de Gritzbach, no qual investiga a relação corrupta de agentes públicos com a maior facção criminosa do país.