Artigo incluído em lei pela Câmara de SP só beneficia 1 prédio de luxo
MPSP diz que lei aprovada na Câmara beneficia um único prédio de luxo, no Itaim Bibi. Legislativo critica órgão e nega benefício direcionado
atualizado
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São Paulo — A Câmara Municipal de São Paulo incluiu um artigo em uma lei urbanística que beneficia um único imóvel: um prédio de luxo irregular no Itaim Bibi, na zona oeste da capital.
O artigo em questão foi incluído na revisão da Operação Urbana Faria Lima, que prevê incentivos e contrapartidas para o adensamento da região mais valorizada da cidade.
A legislação foi aprovada em julho do ano ado, mas até agora o assunto se arrasta na Justiça. Uma liminar requerida pelo Ministério Público de São Paulo (MPSP) já barrou o artigo, mas o tema ainda deve ser julgado pelo Órgão Especial do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP).
O edifício de 24 andares, localizado na Rua Leopoldo Couto de Magalhães, foi erguido mesmo sem ter licenças. O projeto do Edifício Saint Barths, da Construtora São José, previa 20 apartamentos com metragem entre 382 m², com cinco vagas de garagem, a 739 m², com oito vagas. O empreendimento tinha 14,5 mil m² de área construída.
O artigo foi incluído em 2024 em um projeto que teve sua primeira votação dois anos antes. O decreto legislativo foi aprovado em uma votação simbólica no início de julho.
Operação Faria Lima
A gestão Ricardo Nunes (MDB), que havia até cogitado demolir o prédio irregular, sancionou o artigo que permite a regularização de imóveis através da compra de créditos dentro da Operação Faria Lima e pagamento de percentual como punição pela irregularidade.
As operações urbanas estabelecem regras e incentivos ao adensamento construtivo para uma determinada área da cidade. Por meio da venda de CEPACs, a prefeitura consegue créditos para fazer melhorias e investir em habitação especificamente dentro do perímetro da operação –que foi estendida, abrangendo também a favela de Paraisópolis.
O trecho do artigo 17 da lei aprovada prevê que é possível regularizar empreendimentos mediante a compra de CEPACs.
Único beneficiado por trecho de lei
O Ministério Público de São Paulo (MPSP) apurou, no entanto, que o Edifício Saint Barths era o único empreendimento irregular dentro da área da operação urbana, de acordo com a Subprefeitura de Pinheiros. A resposta do órgão municipal à promotoria afirma que “temos periodicamente vistoriado as construções de edifícios residenciais e comerciais na jurisdição da Subprefeitura de Pinheiros, não tendo sido encontrado nenhum outro empreendimento atualmente irregular [além do prédio embargado]”.
A obra foi embargada em 2023 por falta de licença de construção e de pagamento de tributos. A torre já estava quase concluída, embora o empreendimento não tivesse Alvará de Execução de Edificação Nova. O pedido para emissão do documento foi negado pela Prefeitura em agosto de 2022, mas as obras seguiram mesmo sem a licença. Além disso, como o prédio fica na área da Operação Urbana Faria Lima, para construir uma torre tão alta a empresa deveria ter adquirido CEPACs.
A Promotoria afirma que o trecho atende “o único empreendimento irregular na área abrangida pela Subprefeitura de Pinheiros, na qual está inserido o perímetro da Operação Urbana Consorciada Faria Lima”, que “é exatamente o Edifício Saint Barths”. Para o MPSP, o adendo à lei original não tratava do tema e ainda viola o princípio da impessoalidade.
O relator do caso em segunda instância deu razão ao MPSP. Para ele, “revela-se também presente o periculum in mora, na medida em que a permanência da norma impugnada pode acarretar os males apontados, viabilizando, também, a possível regularização de construção ilegal e de difícil reversão, caracterizando-se, portanto, a urgência, de modo a justificar o deferimento da liminar”. A decisão é de 14 de janeiro, mas o mérito ainda será julgado pelo Órgão Especial do TJSP.
O restante da lei já está valendo desde julho do ano ado, mas na prática não produziu efeitos porque a legislação não foi regulamentada pela gestão Nunes. No mercado, há críticas à demora e também quem acredite que ela tem relação com o imbróglio envolvendo o prédio do Itaim Bibi, cuja construtora precisaria participar do leilão para que o assunto seja regularizado.
Além do mercado, que fica em como de espera, a favela de Paraisópolis é uma das prejudicadas por não receber recursos.
Câmara de SP critica MPSP
A Câmara de São Paulo criticou o MPSP por judicializar o artigo da lei e negou a acusação de falta de impessoalidade.
“Tanto em relação à ampliação dos investimentos quanto à regularização de construções, os temas foram tratados de forma coletiva e impessoal, pois a Câmara entende que as medidas devem atingir não apenas uma construção, mas, sim, muitas edificações que se encontram nessas condições”, afirma a Câmara, em nota.
A Casa afirmou que o MPSP, ao “obter uma liminar para suspender o artigo que permitia a regularização, logo após a sua entrada em vigor, teve o efeito de inibir que eventuais outras edificações que estejam em desconformidade pudessem procurar o poder público para regularizar a sua situação e, efetivamente, arrecadar recursos previstos na lei para aplicação em HIS e melhoria da infraestrutura urbana”.
A Câmara afirma, sobre o artigo que possibilita regularização, está previsto que além do pagamento de CEPACs há um acréscimo de 45%, como forma de penalizar aqueles que descumpriram a lei. Esse percentual será usado para a habitação de interesse social. “Não se trata de anistia, pois a regularização obedece a lei vigente.
O que diz a gestão Nunes
A gestão Nunes afirmou que a realização do leilão de CEPACs está prevista para o primeiro semestre deste ano. “Os procedimentos para o registro da nova distribuição de CEPAC da operação não dependem da ação judicial. Desde a sanção da Lei nº 18.175/2024, em 25 de julho de 2024, a gestão municipal tem avançado para garantir a viabilidade do certame e a correta aplicação dos recursos”, diz, em nota.
“O leilão exige um planejamento rigoroso e é acompanhado de perto pelo grupo gestor, composto por representantes da prefeitura e da sociedade civil. A Prefeitura de São Paulo segue conduzindo o processo com transparência e responsabilidade”, afirmou.
Segundo a istração, foi realizado um estudo de viabilidade econômica, que foi apresentado ao Conselho Gestor da operação urbana, no dia 11 de março. “A gestão também tem mantido alinhamento com diversas secretarias para definir as melhores estratégias, com foco no Complexo Paraisópolis.”
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