Björk fala sobre sua mosta que estreia no Museu da Imagem e do Som
Björk Digital entra em cartaz no MIS nesta terça-feira (18/06/2019)
atualizado
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Vinte anos se aram desde o lançamento do clipe All Is Full of Love, da cantora islandesa Björk, que retratava uma comunhão hipnótica entre duas versões robóticas dela mesma. De lá para cá, a artista continuou testando as fronteiras entre música, arte e tecnologia – sem considerar a última, de forma nenhuma, essencialmente maligna ou rasa de sentido. O resultado de todas essas experiências pode ser conferido na exposição de realidade virtual Björk Digital, que estreia no Museu da Imagem e do Som (MIS) nesta terça-feira (18/06/2019).
Björk conversa sobre a mostra. “Eu amo montanhas e escaladas, mas mando mensagens de celular para os meus amigos. Eu amo a praia, mas assisto à Netflix”, afirma. “Minha vida é 50% natureza e 50% tecnologia. Eu não prefiro um ao outro.”
Produzido durante e após o divórcio da cantora com o também artista Matthew Barney, o álbum Vulnicura (2015) é o cerne da exposição que chega ao Brasil após ar pela Europa e América do Norte. Na mostra-instalação, o público pode conferir seis trabalhos do disco (Stonemilker, Black Lake, Mouth Mantra,Quicksand,Family e Notget) com óculos de realidade virtual e fones de ouvido. Uma imersão completa no universo digital de Björk, aprimorado disco após disco.
“Faço as coisas por instinto, mas depois os motivos se tornam mais óbvios”, diz a cantora sobre a escolha dos trabalhos que compõem a exposição. “Vulnicura é um álbum emocionalmente alienante, isolador”, afirma. “É como quando algo terrível acontece com você e você liga para um amigo para contar um segredo”.
Björk define o álbum como “uma ópera de coração partido de uma pessoa só”. E é nesse sentido que procura, em suas próprias palavras, permanecer fiel à música. “É muito difícil explorar a emoção de Vulnicura. Nunca performei o disco em programas de TV por isso. Mas quando alguém coloca os óculos de realidade virtual e os fones de ouvido, é como se eu estivesse cantando para ela. De uma pessoa para outra, e só.”
A experiência pode ser sufocante. Em Black Lake, a tecnologia ajuda a recriar a sensação claustrofóbica de estar dentro de uma caverna, sem conseguir enxergar uma luz no fim do túnel. Em Notget, o público tem a sensação de estar entre escombros, enquanto um avatar da cantora canta e dança acima de suas cabeças. Em Mouth Mantra, tudo se a dentro da boca de Björk.
Trajetória
Björk e tecnologia se desenvolveram lado a lado. A videografia da islandesa, composta por 58 clipes, é parte tão importante da sua obra quanto as músicas. Não à toa, Björk tem em seu currículo trabalhos com diretores reconhecidos, como Spike Jonze (Her) e Michel Gondry (Brilho Eterno de uma Mente Sem Lembranças).
O desenvolvimento da tecnologia, nos últimos anos, permitiu novas extravagâncias visuais. Stonemilker, clipe lançado em 2015, foi gravado em 360 graus. Notget VR, de 2017, se a em um mundo criado virtualmente. Para Björk, a inserção da tecnologia na arte é uma questão de honestidade. “Está presente em tudo, é mais sincero se a incluirmos em tudo o que fazemos”, diz.
No mesmo tom em que conversa sobre trivialidades, Björk ruma para questões filosóficas. Conta que, diz atrás, tomava drinques com um amigo enquanto discutia a dualidade entre claridade e escuridão. “Há milhares de anos, havia uma polarização entre o bem e o mal, representados pela luz e pelas sombras. Hoje, esse conflito talvez se dê entre a natureza e a tecnologia”, afirma. “Para sobreviver, nós precisamos criar pontes entre as duas”.
Fábula
Com mais tecnologia e menos dor, Björk se dedica, agora, ao álbum Utopia (2017), disco que sucedeu Vulnicura e substituiu o registro sonoro de suas feridas abertas por sons de flautas e pássaros, em um clima de sonho. No espetáculo Cornucopia, atualmente em turnê, Björk reúne sete flautistas mulheres, 50 jovens islandeses e caixas de som estrategicamente posicionadas em torno do público, que criam uma experiência de som em 360 graus. “Eu reuni o mais importante das minhas experiências com realidade virtual e levei para o Cornucopia”, explica.
Experiência que os brasileiros não terão, pelo menos a curto prazo. “Eu adoraria voltar ao Brasil”, diz a cantora, que se apresentou no país em 1996, 1998 e 2007. O impedimento é a situação econômica do País. A título de exemplo, os ingressos para o Cornucopia no México custam o equivalente a R$ 2.100.
É possível determinar um álbum preferido, após todas essas experiências? Björk afirma que não. “Todos são memórias, e cada pessoa recebe cada álbum de uma forma”, diz. “É impossível saber qual disco é ‘o melhor’.”
Colaborações
Com 56 vídeos na carreira, Björk trabalhou com grandes nomes do cinema e do audiovisual. Entre eles, estão Michel Gondry, Spike Jonze e Andrew Thomas Huang. O francês Michel Gondry, de Brilho Eterno de Uma Mente Sem Lembranças e A Espuma dos Dias, dirigiu os clipes de Human Behaviour (1993), Army of Me (1995), Isobel (1995) Hyperballad (1996), Jóga, Bachelorette (1997), Declare Independence (1996) e Crystalline (2011). É um dos diretores mais recorrentes na videografia de Björk.
Spike Jonze (Her) dirigiu It’s Oh So Quiet(1995), baseado no filme Os Guarda-Chuvas do Amor, de Jacques Demy. No vídeo, como na música, Björk alterna entre momentos de silêncio e euforia, acompanhada, por vezes, de dançarinos. O clipe se tornou um dos mais conhecidos da carreira da islandesa. O americano também filmou It’s in Our Hands (2002) e Triumph of a Heart (2005).
O sino-americano Andrew Thomas Huang (Rift) é o principal nome nos clipes que compõem a exposição Björk Digital. Huang dirigiu três dos seis trabalhos expostos – Stonemilker (2015), filmado em 360 graus, em uma praia; Black Lake (2015), que mostra Björk em uma caverna, e Family (2015), onde um avatar da cantora costura uma ferida no peito. Além deles, assina The Gate (2017), vídeo que marca a transição estética e conceitual entre os álbuns Vulnicura e Utopia. Os outros vídeos da mostra são assinados pelo artista visual Jesse Kanda (Mouth Mantra), e pelo duo londrino Warren Du Perez e Nick Thronton James (Notget).