Vítimas de estupro terão de aguardar atendimento com criminosos no IML
Inaugurado em 2018, espaço de atendimento privativo para vítimas de estupro no IML foi demolido nessa 4ª feira (5/1)
atualizado
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Em razão da reforma no Instituto Médico Legal (IML), no Complexo da Polícia Civil do Distrito Federal (PCDF), no Parque da Cidade, o espaço de acolhimento destinado às vítimas de estupro e outros crimes sexuais foi demolido na manhã dessa quarta-feira (5/1).
Essa mudança coloca, mulheres e crianças no mesmo ambiente de agressores para aguardar os exames de perícia médica realizados no IML — vítimas de outros crimes também devem compartilhar o espaço. Foram destruídos a antessala, brinquedoteca e banheiro privativo da Sexologia Forense.
Iniciada em abril do ano ado, a reforma no prédio deveria durar dois anos, mas segundo uma fonte, que pediu para não ser identificada, a obra está embargada e sem data para conclusão.
De acordo com a mesma fonte, o avanço trazia um mínimo de “dignidade” para os atendidos. “Agora que a obra está embargada, a gente não sabe por quanto tempo a vítima [de estupro] terá que ficar desse jeito. Às vezes, ela tá toda machucada, com a roupa cortada. Isso é um absurdo. A vítima não pode esperar com todo mundo. Ela irá ficar no mesmo corredor [à espera de atendimento], podendo encontrar com o mesmo agressor que cometeu o crime”, reclama.
Por conta da medida, as vítimas também terão de ocupar o espaço dos bancos de fora da perícia médica (imagem acima) em razão da pandemia da Covid-19. Lá não há distinção entre o tipo de crime cometido.
A recepção do Atendimento Médico Pericial Especializado do IML começou a funcionar em março de 2018 e ou a receber mulheres, adolescentes e crianças alvos da violência urbana, doméstica e sexual. Na época, foi realizado um curso com os servidores destinados à acolhida das vítimas que sofreram este tipo de crime.
Comissão de Direitos Humanos da CLDF
A Comissão de Direitos Humanos da Câmara Legislativa do Distrito Federal (CLDF) recebeu notificação sobre o caso e enviou na quarta-feira (5/1) dois ofícios. Um foi destinado ao Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT) e outro para o Delegado-Geral da PCDF, Robson Cândido. Segundo o deputado Fábio Félix (PSol), presidente da comissão, a retirada da sala é um “absurdo”.
O distrital informa que é solicitada análise do caso com vistas à reconsideração sobre a desativação temporária do espaço, que se faz de suma importância para o acolhimento e enfrentamento à revitimização das pessoas as quais sofreram crimes sexuais.
O que diz a PCDF
Procurada, a diretora do IML, Marcia Reis, responsável pela manutenção do prédio, informou que atualmente o Instituto Médico Legal conta com “três ambiente exclusivos para atendimento” de vítimas de violência sexual. Algumas adaptações, inclusive, foram iniciadas a fim de melhorar o o aos três espaços.
A diretora confirmou a demolição de parte das edificações que atendia o público, mas justificou que é para a ampliação da área a fim de melhorar os serviços à população.
Confira a nota na íntegra:
Em atenção aos questionamentos do Jornal Metrópoles, esclarecemos que o IML conta com estrutura de 3 ambientes exclusivos para atendimento às vítimas de violência sexual: sala de acolhimento/espera, sala de entrevistas médica e sala de exame propriamente dita. Esses ambientes mantêm entrada separada da recepção geral do IML. Informamos que, no momento, algumas pequenas adaptações foram iniciadas na antessala que dá o aos três ambientes, além de melhorias, como revitalização de pintura e isolamento acústico, da sala de acolhimento/espera. As adaptações tornaram-se necessárias tendo em vista que parte das edificações do IML já foram demolidas para dar lugar à construção do novo IML, que ampliará sua capacidade e conforto a toda população. Tais medidas traduzem a atenção compartilhada pela Direção do IML e peritos médicos legistas no sentido de não revitimizar as pessoas atendidas em situação de vulnerabilidade, mormente mulheres e crianças. Adicionalmente, informamos que o tratamento humanizado inclui o fornecimento de uma “bolsa de crise”, contendo vestes e produtos de higiene, para que a vítima possa tomar banho e deixar suas vestes para eventuais perícias, caso necessário.
Obras no IML
Inicialmente estimado em R$ 39 milhões, o valor final do contrato ficou em R$ 34,8 milhões. A nova sede, que seguirá localizada no Complexo da PCDF, no Parque da Cidade, terá edificação composta por subsolo, térreo e mais dois pavimentos, com sistema de ar condicionado, grupo moto-gerador, sistema de sprinklers e já adequado à nova identidade visual da Polícia Civil.
O espaço também contará com diversas funcionalidades: os separados para exames em pessoas vivas e mortas, assim como entrada independente para os custodiados; recepção separada para atendimento às mulheres vítimas de violência; central de remoção de órgãos e laboratórios amplos e adaptados para as tecnologias mais atuais.
À época, o governador do Distrito Federal, Ibaneis Rocha, ressaltou que o edifício vai proporcionar “mais eficiência” ao trabalho da polícia. Confira, abaixo, as postagens:
“Situação caótica”
O atual prédio do IML foi construído em 1983 e possui uma área de 3.088 metros quadrados. O novo edifício terá um total de área construída de 11.882,54 m². A PCDF informou, na seção Justificativa e Interesse Público do Projeto Básico da licitação, que o edifício “há muito [tempo] não atende a requisitos essenciais, como espaço físico adequado, salubridade, segurança e conforto para usuários e servidores”.
A corporação disse que a situação é “caótica” e citou a diminuição gradativa das áreas de ventilação em decorrência da construção de “puxadinhos” como forma de mitigar a “discrepância de sua área física em relação à crescente demanda oriunda do crescimento da capital, com o natural comprometimento de sua funcionalidade”. Segundo a corporação, mais de 100 mil pessoas circulam por ano no IML. O instituto realiza mais de 55 mil exames periciais anualmente.