As mensagens ameaçadoras de um hacker para um delegado: “Aguarde, safado”
Durante a investigação, o delegado Erick Sallum recebeu mensagens ameaçadoras enviadas pelos hackers, pelo Telegram
atualizado
Compartilhar notícia

Atrevidos e arrogantes, integrantes da associação criminosa alvo da Operação RockYou, desencadeada pela Polícia Civil do Distrito Federal (PCDF), nesta terça-feira (20/6), chegaram a ameaçar, por meio de mensagens, um dos delegados da 9ª Delegacia de Polícia (Lago Norte) que conduziu a investigação.
A ação cumpriu mandados de busca e apreensão, de prisão temporária, além de bloqueio de contas bancárias e criptomoedas, takedown (derrubada) de websites e takeover (inversão de controle) de servidores com o objetivo de desarticular associação criminosa que vendia na internet informações sigilosas da população brasileira, incluindo autoridades.
Durante a apuração, o delegado Erick Sallum recebeu mensagens ameaçadoras enviadas pelos hackers, pelo Telegram. Em um dos ataques, o hacker afirmou que sabia quem era o investigador. “Amigo saiba que temos sistema pra consultar todas suas informações. Fique ligado já sabemos quem você é”, ameaçou.
Veja print de ameaça enviada ao delegado da PCDF:
Ameaça
O hacker segue no diálogo e chega a chamar o delegado de “P2”, como é classificado o serviço velado da Polícia Militar. “Vamos ver quem se dá melhor, seu P2 desgraçado”, afirmou o criminoso na mensagem. O suspeito finaliza a conversa ameaçando o delegado mais uma vez. “Entrou no jogo agora não tem como sair mais em. Aguarde safado”.
As ameaças não surtiram efeito e o autor das ameaças foi um dos presos na operação. De acordo com as investigações, os dados eram instrumentalizados para o cometimento de uma infinidade de fraudes eletrônicas, elaboração de dossiês contra personalidades públicas e violação da intimidade dos cidadãos.
Perícia do Instituto de Criminalística da PCDF comprovou que os dados do governador do Distrito Federal, Ibaneis Rocha (MDB), de parlamentares da Câmara Legislativa (CLDF) e da esfera federal, como ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) e outras altas autoridades da República, estavam também expostos.
Após a prisão de vários golpistas, a PCDF descobriu que esses dados estavam sendo comercializados na dark web por meio da compra de o aos chamados “painéis de consulta”.
Policiais infiltrados em grupos criminosos do Telegram conseguiram, então, comprar o a um desses “painéis”, denominado “ Analytics”. O o era vendido em pacotes de o por 7, 15 ou 30 dias, custando, respectivamente, R$ 150, R$ 200 e R$ 350.
200 milhões de Fs
Com autorização judicial, perícias efetivadas nesse website apontaram que praticamente a integralidade da população brasileira encontrava-se exposta.
São cerca de 200 milhões de Fs contendo números de celular, endereços residenciais, endereços de e-mail, fotos, s digitalizadas, cópias da CNH com número de segurança, carros, armas, empresas, boletins de ocorrência, mandados de prisão, pesquisas por CEP e faixa etária, pesquisa de vizinhos, dados completos de parentes, score em instituições financeiras e muitas outras informações.
Todos esses dados encontravam-se no website organizados de maneira profissional, permitindo rápidas pesquisas em múltiplos módulos, de forma que qualquer leigo pudesse, em alguns cliques, levantar a vida inteira de qualquer cidadão. Os criminosos também tinham o às câmeras de OCR (leitura de placas), permitindo a localização das últimas agens das vítimas nas rodovias de todo o país e, portanto, possibilitando o acompanhamento de suas rotinas.
A investigação comprovou que esses painéis são a fonte de informação dos criminosos e que, a partir deles, são selecionadas as vítimas e montadas as estratégias para enganá-las. Essas informações também podem ser usadas para levantar a vida de policiais, membros do MP e juízes, colocando em risco a integridade dessas autoridades e de seus familiares.
“Com as buscas cumpridas nesta manhã, a PCDF visa compreender a origem do que considera um dos maiores vazamentos de dados da história do país e como os autores estavam tendo o a dados sigilosos da população brasileira, em especial o hackeamento on-line das câmeras de reconhecimento de placas”, explicou o delegado Erick Sallum.
“Descobrimos indícios veementes de que grande parte dessas informações é oriunda de hackeamento de órgãos públicos. Contudo, também detectamos um comércio ilegal por pseudoempresas de proteção de crédito. À revelia da Lei Geral de Proteção de Dados, os dados pessoais da população brasileira têm sido vendidos massivamente às escondidas e sem qualquer critério de sua destinação”, completou.
Após cerca de um ano de investigação, a 9ª DP conseguiu identificar os dois hackers responsáveis pelo , ambos presos nessa terça pelo cometimento dos seguintes crimes: divulgação de segredo, invasão de dispositivo informático, organização criminosa, lavagem de dinheiro, com penas somadas que ultraam 20 anos de reclusão.
A investigação também obteve os logs de todos os 1.453 usuários que haviam comprado o a esse . Essas pessoas serão objeto de investigação para explicar por que e para que estavam pesquisando dados de terceiros. Além do “ Analytics”, foram mapeados outros no mesmo padrão que também estão sob investigação.
“Nosso objetivo, além da prisão desses criminosos, é alertar aos demais órgãos de controle e forças policiais sobre esse fenômeno criminal, de forma a potencializar a repressão. Emitiremos relatório de inteligência às polícias civis de outros estados nos quais sabemos haver painéis desse tipo. Também provocamos a Autoridade Nacional de Proteção de Dados para que fiscalize as empresas que estão vendendo por debaixo da mesa dados brutos da população brasileira desrespeitando a LGPD”, concluiu Sallum.