Para a moda ser levada a sério, ela tem que parar de ser fútil
Dois exemplos que aconteceram nos últimos anos mostram aonde quero chegar
atualizado
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Acho que a maioria das pessoas que tem trabalho relacionado à moda sofre preconceito constante e dificuldade em fazer os outros entenderem que nossa profissão é séria, sim. Se tem alguma coleguinha minha que nunca ouviu coisas como “seu mercado é fútil” ou “gente da moda é muito desmiolada” que atire a primeira pedra.
E tô aqui hoje para fazer um mea culpa, para dar um recado importante: se queremos ser tratados como gente grande, precisamos nos comportar como tais. Vou usar dois exemplos que foram comentadíssimos nos últimos anos para vocês verem aonde eu quero chegar.
O primeiro foi o desfile Primavera Verão 2015 da Chanel que Karl Lagerfeld apresentou em Paris em 2014 (foto de abre). Para quem não lembra, a apresentação encenava uma manifestação feminista, com as tops mais lindas, magras e loiras segurando cartazes com dizeres vazios tipo “Free Freedom” ou “Fashion, Not War”.
Oi? Péra, o mundo fervilhando para um movimento social tão importante como o feminismo e a pessoa vem usar essa evidência para vender moda de uma maneira tão barata e oca! Isso é um desfavor a todas as mulheres que estão lutando por seus direitos. Quer dizer, isso é um desfavor a todas as mulheres.É a desconstrução de tudo o que a luta das mulheres prega: gente que foi obrigada a ser magra para estar ali, gente que está vendendo produtos de altíssimo luxo, que vai ser consumido por uma elite restritíssima, não pode se apropriar do discurso desse jeito. É nocivo!
E quando a imprensa especializada aplaude e fica só na superfície da estética do espetáculo, isso somos nós, validando o que a moda tem de mais negativo: a futilidade e a incapacidade de ter uma postura séria enquanto meio de expressão.
O segundo evento foi a chuva de críticas que a figurinista Jenny Beavan recebeu ao levar o Oscar 2016 de melhor figurino, por Mad Max, vestida com calça e jaqueta de couro. Jenny foi fuzilada nas redes sociais e pela plateia que, em parte, se recusou a aplaudi-la.

Estamos nos tempos em que as atrizes já não aceitam que a pergunta “quem assina seu look?” seja feita só para elas (né, Cate Blanchett? Né, Lupita?). Estamos lutando para que beleza não seja o único assunto sobre o qual uma mulher pode falar nos eventos de gala. Quem se lembra da campanha #askhermore no Twitter? E reagimos assim quando a colega se recusa a seguir o dress code do red carpet!?
Ah, aliás, sobre o tal dress code, a Jenny respondeu assim, bem de boa: “Eu não uso vestidos e saltos. Eu simplesmente não posso, tenho problemas nas costas. Eu ficaria ridícula em um vestido e isso foi uma homenagem para Mad Max. Estou me sentindo confortável e, até onde percebo, estou realmente arrumada!”. Ponto para quem, hein?