Trama golpista: STF ouve Hamilton Mourão como testemunha
Pela manhã, o STF ouviu testemunhas de defesa do deputado Alexandre Ramagem e do ex-ministro Braga Netto no âmbito da ação que apura golpe
atualizado
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Após uma manhã com depoimentos de duas testemunhas de defesa indicadas pelo deputado federal Alexandre Ramagem (PL) e pelo ex-ministro da Casa Civil Braga Netto, o Supremo Tribunal Federal (STF) segue, na tarde desta sexta-feira (23/5), com as oitivas no âmbito da ação penal que apura suposta trama golpista contra a eleição de Lula (PT) em 2022.
Um dos depoimentos será dado pelo senador Hamilton Mourão (Republicanos-RS), ex-vice-presidente da República. Na fase atual, são ouvidas as testemunhas de defesa dos réus do chamado núcleo 1, composto por oito pessoas, incluindo o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).
Às 8h, foi realizado o depoimento do delegado e ex-integrante da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) Carlos Afonso Gonçalves Gomes Coelho, testemunha indicada por Ramagem. Antes do início, o procurador-geral da República, Paulo Gonet, pediu que a testemunha fosse desqualificada, pelo fato de Coelho ser investigado no caso da chamada “Abin Paralela“.
Gonet argumentou que, por estar na condição de investigado, Coelho não tem o dever de falar a verdade, uma vez que não pode ser compromissado e tem o direito de não se autoincriminar.
“A testemunha é investigada em duas petições por participar da ‘Abin Paralela’. A testemunha foi alvo de medidas cautelares, inclusive de afastamento do cargo, e eu acredito que ela se ajusta a uma decisão tomada por vossa excelência. Tem a garantia do direito ao silêncio, de não fornecer elementos de provas que o prejudiquem, enquanto a testemunha presta o compromisso de dizer a verdade”, disse Gonet.
O advogado de Ramagem se manifestou e destacou que a testemunha convocada pelo parlamentar poderia contribuir com informações sobre a utilização do software israelense FirstMile — programa que permite a espionagem de pessoas por geolocalização do celular, sem violar os marcos temporais da denúncia.
“A denúncia fala que as atividades começaram em julho de 2021, mas o sistema teve o contrato finalizado em maio de 2021. Portanto, excelência, a defesa entende que, neste caso, concreto o depoimento da testemunha não violaria o seu direito de não produzir provas contra si mesmo porque não é objeto deste processo”, alegou o defensor.
Na sequência, o ministro Alexandre de Moraes ressaltou que Coelho tem o direito ao silêncio, justamente para não se autoincriminar. Dessa forma, ele não será compromissado, ou seja, não terá obrigação de dizer a verdade sobre fatos que possam prejudicá-lo.
“Ouvirei ele. Ele não prestará compromisso, não está obrigado a dizer a verdade sobre os fatos que o podem autoincriminar. Mas já advirto que, em relação aos fatos que ele não esteja investigado, ele não tem direito a mentir. O direito ao silêncio não é um direito amplo à mentira”, reforçou Moraes.
Coelho foi questionado apenas pela defesa de Alexandre Ramagem. Ao ser perguntado sobre o software, afirmou que, à época, o órgão, então chefiado por Ramagem, concluiu que não havia indicação de “nenhuma irregularidade ou ilegalidade do ponto de vista documental”. Segundo ele, sua atribuição se limitava à esfera istrativa, e não à operacional.
“A verificação consistiu essencialmente na análise de documentos. Diante das informações prestadas [durante a aquisição do programa], não havia, naquele momento, indicativo de irregularidade formal”, declarou.
O delegado relatou, ainda, que uma das orientações — segundo ele, transmitida até de forma ríspida — partiu do então secretário de Planejamento da agência, Paulo Maurício Fortunato Pinto. A ordem era clara: “as discussões e questionamentos sobre a utilização da ferramenta deveriam ser tratados exclusivamente no âmbito da alta gestão da agência”.
“Ficou claro que qualquer questionamento sobre uso ou finalidade da ferramenta não era atribuição da Diretoria istrativa, mas da alta gestão, incluindo o próprio diretor-geral e o diretor-adjunto”, disse.
Inquirição
Em seguida, prestou depoimento o coronel do Exército Waldo Manuel de Oliveira Aires, testemunha indicada pela defesa de Braga Netto.
O coronel relatou que esteve com Braga Netto no dia 8 de janeiro de 2023, quando se encontraram para jogar vôlei no Posto 6 de Copacabana, no Rio de Janeiro. Segundo ele, o ex-ministro se surpreendeu com os atos antidemocráticos ocorridos em Brasília.
“Acredito que para todo mundo foi uma surpresa. Ninguém esperava. A manifestação até que esperávamos, mas aqueles atos de depredação ninguém esperava. Causou uma certa surpresa em todo mundo. Isso porque histórico de manifestações de conservadores sempre foi pacífica”, afirmou.
Após a fala, o advogado de defesa de Braga Netto devolveu a palavra, e o ministro Alexandre de Moraes questionou se algum outro defensor desejava fazer perguntas, mas não houve manifestações. Diante disso, Moraes ou a questionar Aires diretamente sobre informações divulgadas na imprensa de que o oficial defenderia uma interpretação do artigo 142 da Constituição que permitiria intervenção militar. O coronel negou.
“Não me recordo, excelência, mas talvez tenha colocado em alguma coisa nesse sentido. O artigo 142 é algo inconstitucional”, respondeu Aires.
Na sequência, Moraes o interrompeu para corrigir: “O 142 é constitucional. Está na Constituição. Para você, isso causaria uma intervenção?”, questionou o ministro.
O coronel respondeu: “Não, senhor”.
Moraes, então, quis saber se Aires havia discutido com Braga Netto o uso incorreto do artigo.
“Não. Eu e ele nunca tocamos em assunto de política, até para manter a nossa amizade”, concluiu o coronel.
Depoimentos
Até o momento, prestaram depoimento ao STF, em audiências sob o comando do ministro Alexandre de Moraes, as testemunhas indicadas pela Procuradoria-Geral da República e pela defesa do colaborador Mauro Cid.
O STF ouvirá ainda nesta sexta-feira as testemunhas indicadas pelo ex-ministro do Gabinete de Segurança Institucional (GSI) no governo Jair Bolsonaro, Augusto Heleno; e do ex-comandante da Marinha Almir Garnier Santos. Entre desistências e pedidos para não depor, serão seis pessoas como testemunhas de defesa dos réus.
Confira os nomes e horários:
Dia 23/5/2025, às 14h
Testemunhas de Augusto Heleno Ribeiro Pereira:
Hamilton Mourão (testemunha também das defesas de Jair Bolsonaro, Paulo Sérgio Nogueira e Braga Netto);
Alex D’alosso Minussi;
Gustavo Suarez da Silva.
Testemunhas de Almir Garnier:
José Aldo Rebelo Figueiredo.
Pedido do comandante da Marinha
O comandante da Marinha, almirante-de-brigada Marcos Sampaio Olsen, foi indicado pela defesa de Almir Garnier para depor como testemunha de defesa. No entanto, Olsen pediu ao ministro Alexandre de Moraes para não prestar depoimento ao STF como testemunha de defesa em ação que analisa trama golpista. Moraes, porém, negou o pedido, e Olsen terá de depor. A oitiva dele está prevista para esta sexta-feira (23/5), às 14h.
A defesa de Garnier recusou a desistência do atual comandante da Força. Em petição enviada na tarde desta quinta-feira (22/5), os advogados do ex-comandante sustentaram que, embora Olsen alegue não ter conhecimento dos fatos, o depoimento dele é essencial para esclarecer “pontos cruciais à defesa do acusado, especialmente no que se refere ao contexto da nota à imprensa divulgada pela Marinha do Brasil em 27 de novembro de 2022, a qual guarda relação direta com os fatos investigados”.
A defesa também argumentou que é “igualmente essencial esclarecer, sob o crivo do contraditório, se, à época dos fatos narrados na denúncia, houve qualquer conversa ou tratativa interna relacionada à movimentação ou preparação de tropas, tendo em vista que a testemunha arrolada exercia, naquele período, o cargo de Comandante de Operações Navais (CON) da Marinha do Brasil”.
No documento, os advogados destacaram ainda que Olsen foi formalmente intimado para depor e, como então comandante de Operações Navais, tinha responsabilidade direta sobre o planejamento e execução de todas as operações militares navais, tanto em tempos de paz quanto de guerra. “Sendo-lhe subordinados todos os meios de combate”, reforçou a defesa.
Almir Garnier é um dos oito réus na ação penal contra o chamado núcleo 1, que inclui também o ex-presidente Jair Bolosonaro (PL).
Na ação, Garnier é apontado como o comandante de uma das forças armadas que teria concordado com um plano apresentado por Bolsonaro para impedir que o presidente eleito em 2022 tomasse posse.