Militarização do Espaço é questão de tempo (Por Felipe Vasconcelos)
Países irão enxergar no espaço um quintal para satélites e armas
atualizado
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No curso da história humana, nunca houve ambiente no qual, com tecnologia suficiente, nações e potências se recusaram a utilizá-la para melhorar sua posição no complexo xadrez entre as nações e, sobretudo, em eventuais conflitos bélicos.
Os oceanos viram este fenômeno desde antes das grandes navegações até as avançadas marinhas de hoje. Os ares também foram alvo de fenômenos semelhantes desde a Primeira Guerra Mundial até os caças de sexta geração que estão por vir.
No entanto, conforme a tecnologia e as disputas geopolíticas avançam, um novo ambiente será, cedo ou tarde, explorado para fins bélicos e, assim, se tornará uma nova arena de disputa geopolítica entre as potências mais desenvolvidas tecnologicamente: o espaço sideral.
Com a Guerra Fria e o fenômeno da Corrida Espacial, as discussões internacionais acerca da cooperação no Espaço ganharam força. Em 1967, o Tratado do Espaço Sideral foi acordado entre as principais nações tecnologicamente desenvolvidas, proibindo o desenvolvimento de diversas atividades militares no espaço. No entanto, há de se perceber que, desde então, nações ignoraram este acordo e tentaram estabelecer programas bélicos na órbita terrestre. Exemplo fundamental disso é Star Wars, criado pelos EUA durante o governo Reagan. Nem este, nem nenhum projeto parecido teve grande êxito, no entanto, com o avançar da tecnologia e dos conflitos geopolíticos, esta realidade parece estar mudando.
Everett C. Dolman, professor de Estratégia e Relações Internacionais da Força Aérea Americana, e escritor do livro Astropolitik – Classical Geopolitics in the Space Age, identificou, em 2002, um fenômeno praticamente inegável: com o avanço da tecnologia e a busca por novos tabuleiros de disputa geopolítica, o espaço no século XXI irá surgir como uma esfera de vital influência para as potências, dando importância ao espaço quanto os geopolíticos do século XX, davam aos oceanos e ao leste europeu.
Esta tendência identificada pelo professor vem se tornando cada vez mais real e não são poucas as evidências deste fenômeno. Nos últimos anos, cada vez mais países apostam na criação de forças espaciais dentro de suas Forças Armadas, como o exemplo dos EUA em 2019, além da França, Rússia, Japão, Reino Unido e inúmeros outros. Assim, se desenha um cenário no qual a militarização do espaço se torna cada vez mais provável e, mais do que isso, visado por diferentes potências. PxHere
Os EUA, por exemplo, na figura do General Chance Saltzman, da Força Espacial, manifestam seu otimismo com relação à maturidade tecnológica do país e se vê pronto para avançar em seus programas militares no espaço. A prioridade americana, no momento, está na instalação de interceptadores de mísseis no espaço, que apresentariam mais vantagem na defesa aérea americana.
Dessa forma, é improvável que o espaço sideral não se torne um novo centro de disputa geopolítica (ou, precisamente, ‘astropolítica’) entre as grandes potências, que com o avanço da tecnologia anseiam por colocar em prática políticas e ferramentas que apenas teriam lugar no espaço, tal qual o já mencionado programa de mísseis interceptadores americanos. Neste futuro cenário, embora esteja longe de frotas ou batalhas espaciais, a grande probabilidade é que os atuais acordos do Direito Espacial se tornem ultraados e sejam desrespeitados ou, no melhor dos cenários, substituídos por acordos mais atualizados.
Em linhas gerais, as tendências futuras indicam que, cada vez mais, países irão enxergar no espaço um quintal para satélites e armas, com a busca por novas áreas de disputa e o advento das novas tecnologias tornando a modernização do Direito Espacial uma necessidade. O espaço, assim como o mar e os céus, nos prova, uma vez mais, que a natureza humana anda de mãos dadas com a militarização de qualquer ambiente ou ferramenta possível em nome de sua própria segurança.
Felipe Vasconcelos é criador do Observatório Atena, perfil que visa difundir conhecimento sobre geopolítica, história e economia para estudantes, além de já ter trabalhado na Coordenadoria Especial de Relações Internacionais e Cooperação da Prefeitura do Rio de Janeiro, lecionar cursos de geopolítica para jovens e escrever sobre Política Internacional em diversos portais.